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AQUILO QUE HABITA EM MIM

2005 - 2012

Em um instante, encontramo-nos olhando para o trabalho do artista na busca de algo que satisfaça a razão. Mas não conseguimos fechar um raciocínio, ele não nos leva a um lugar determinado, não nos propõe certezas nem respostas. Ficamos a olhar, e continuamos, porque sua poesia, leveza e forma tranquila de dialogar usando poucas, mas contundentes, palavras nos apreende; esse sentimento nos persegue pelo espaço expositivo. É assim que trabalha Leonardo Ramadinha, procurando esvaziar de sentidos suas imagens a fim de tocarmos algo interior, mais primitivo e natural, universal e simples.

As imagens nesta mostra falam daquilo que habita o artista Ramadinha e, diante dos trabalhos, acabamos por nos ver espelhados, cheios de pontos de congruência com o autor. São imagens capturadas em um espaço de dez anos, aleatórias e aparentemente desconexas. Esse processo livre, íntimo e afetuoso do artista com suas imagens é que faz delas um registro mais profundo de quem ele é. Incrível notarmos que possuímos os mesmos sentimentos que o autor, conectamo-nos com coisas similares do mundo, da natureza, do etéreo, e, por isso, nos flagramos olhando mais tempo para uma ou outra fotografia, apreendidos nesse labirinto de imagens.

Ramadinha apresenta uma série de situações lúdicas esvaziadas de sentido e objetivos palpáveis que nos faz passear pela complexidade de sua existência, sinalizando para diversos caminhos e possibilidades sem nunca determinar aquilo que devemos ver ou sentir. Cada observador de suas imagens levará consigo sua particular e única impressão.

A fotografia é comumente confundida com algo que explica e determina; muitos de nós procuramos sentido quando apreciamos uma imagem fotográfica. Nas imagens do artista, o que observamos é um desnudamento lento, gradativo e generoso.

Uma conversa afetuosa onde a poesia ocupa os espaços, preenche nossas retinas, sem procurar definir nada, somente sugerindo caminhos que possamos adentrar, ou não, seguindo nossas próprias vivências, conectando-nos com a abrangência de seu projeto autoral. Como num jogo de palavras, as imagens colocadas lado a lado vão se emprestando sentidos, composições poéticas, montagens que se comunicam pela relação entre os elementos e pelas conexões que o artista sugere. Encadeamentos que nos levam a criar um grande poema visual.

Esse trabalho de captura e seleção de imagens em um período de tempo expandido demonstra como o artista procura gradativamente depurar sua produção na busca de um sentido poético mais profundo. Interessante observar que o caminho que o artista escolhe é justamente o da simplicidade e leveza. Não vemos em seu trabalho imagens de grande malabarismo técnico, ele não se preocupa em arrancar o ar de nossos pulmões com visões magníficas; ao contrário, seu trabalho, leve e sutil, conquista-nos com o tempo, ficamos a olhar essas imagens e vamos lentamente nos colocando dentro de seus devaneios, em um processo de transferência e assimilação, construindo, cada um de nós, nossos próprios relatos ficcionais daquilo que acreditamos habitar o artista e, por fim, a nós mesmos. Ao entrar em contato com a produção de Ramadinha, contaminamo-nos por completo com a universalidade de sua poética e nos flagramos observando suas obras como se tivéssemos frente a um espelho, numa experiência de pertencimento, tornando o contato com seu trabalho uma vivência cada vez mais íntima e intensa.

Marco Antonio Portela

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